OS DEFICIENTES VISUAIS E O ACESSO À INFORMAÇÃO
Chirley Cristiane Mineiro da Silva
Jaqueline Turatto
Lizete Helena Machado
Resumo
Levantamento das instituições e recursos existentes em
Florianópolis que facilitam a vida dos deficientes visuais, via
processos informacionais. Descreve as instituições da Grande
Florianópolis que estão tecnicamente preparadas para desempenhar
este papel e arrola as dificuldades enfrentadas, ainda, pelos deficientes
com relação ao acesso à informação.
Considera o acesso à informação importante para facilitar
a integração dos deficientes visuais á sociedade.
Palavras-chave: Acesso à informação; Deficientes
visuais; Recuperação da informação; Associação
Catarinense para Integração aos Cegos; Fundação
Catarinense de Educação Especial.
1 INTRODUÇÃO
A falta de informação enfrentada pelos deficientes visuais
da grande Florianópolis justificou a necessidade de futuros
profissionais da informação conhecerem, um pouco mais,
os meios, os processos e as técnicas utilizadas pelos portadores
de
deficiência visual para ter acesso às informações.
Para os deficientes visuais, a grande dificuldade no processo informacional
está relacionada ao acesso a documentos
escritos em sistema adequado. Ainda, há pouco material transcrito
para o Braille (anagliptografia), desfavorecendo assim
o processo de educação e o desenvolvimento cultural dos
portadores dessa deficiência.
A presente pesquisa, procura reunir informações sobre instituições
que possibilitam recursos destinados à
socialização/educação dos deficientes visuais.
Procura levantar, também, as dificuldades dos portadores de deficiência
visual, na grande Florianópolis, no que concerne aos aspectos de
busca da informação. Assim, dar seguimento ao trabalho de
Machado e Ohira (1996), que realizaram uma pesquisa sobre a comunidade dos
deficientes visuais na grande Florianópolis.
2 OBJETIVOS
2.1 Geral
Levantar os recursos educacionais e informacionais existentes, na grande
Florianópolis, que possibilitam aos
deficientes visuais formas de acesso à informação
e com isso facilitem a integração social desses deficientes
na sociedade.
2.2 Específicos
a) mapear o processo de atuação das instituições
que se propõem a prestar serviços para os deficientes visuais;
b) traçar o perfil sócio-econômico do deficiente
visual;
c) identificar os meios de informação disponíveis
para os deficientes visuais;
d) apontar as dificuldades que os deficientes visuais encontram para
o acesso às informações.
3 REVISÃO DE LITERATURA
Na área da deficiência visual encontram-se, no Brasil, algumas
instituições e fundações ligadas à educação
do
deficiente visual.
As escolas de educação especial reabilitam o deficiente,
mostrando formas de acesso à informação. Possuem,
igualmente, salas equipadas com recursos para que estes aprendam a viver
em sociedade. Fernandes (1999, p.5) salienta que, um dos princípios
fundamentais das escolas inclusivas é de que todos os alunos possam
aprender juntos, devendo se adaptar aos diferentes estilos de aprendizagem,
necessitando então de currículos adequados e de estratégias
pedagógicas de cooperação entre comunidades.
Na literatura, as abordagens sobre a pessoa deficiente visual tratam
das dificuldades de convivência dessa pessoa em
sociedade. Como ressalta Borges (1996) a formação da criança
e do jovem cego é muito prejudicada por falta de acesso a
recursos, tecnologia e cultura. Tais ausências criam barreiras
para a integração do deficiente visual à sociedade.
Pereira (1996, p. 28) constata que “se deve considerar como fator primordial
para a educação e cultura das pessoas o
acesso ao acervo cultural, sobretudo, através de livros”. Verifica,
no entanto, que a pessoa portadora de deficiência
visual muitas vezes está impedida desse acesso se não lhe
forem providenciadas as publicações especiais impressas no
sistema
Braille. O livro, para ela, se constitui em um dos recursos de aprendizagem,
aperfeiçoamento e distração. O acesso ao livro é
relativamente fácil para as pessoas com visão e se torna
difícil para as pessoas cegas. Estas ficam, na maioria das vezes,
dependentes de instituições que disponibilizam livros em
Braille para leitura, ou de pessoas de boa vontade que “emprestam”
seus olhos e se tornam suas “ledoras” (termo que designa aquele que lê
para a pessoa cega).
Pereira (1996) enfatiza “que” se houver informação utilitária,
lazer e técnica biblioterapêutica, de acordo com a
necessidade desse estrato social, isto irá oportunizar o ajustamento
bio-psíquico, social e pedagógico da clientela cega,
através de sua participação em programa de integração
social. Além disso, tal procedimento, irá atender às
necessidades de
uma população carente de tais serviços.
É necessário, também, educar o deficiente para que
ele possa ter acesso às informações. O acesso à
informação é
importante, na medida que esta, segundo Melo (apud Pereira, 1996, p.12),
Quando concebida como um recurso irá afetar todas as áreas
do conhecimento humano. Quando bem utilizada, por quem detém o poder
decisório, poderá contribuir para provocar transformações
no campo social, político e
econômico e conduzir ao processo de conquista de melhores condições
de vida a nível individual e social.
A informação é básica e fundamental, todos
deveriam ter o direito ao seu acesso. Conhecimento, cultura e lazer, também,
deveriam estar acessíveis a todas as classes sociais. Para Borges
(1999) os deficientes visuais poderiam ser mais produtivos se
eles tivessem acesso ao ensino profissionalizante adaptado, e se existisse
treinamento para uma série de atividades que eles
poderiam perfeitamente realizar, com preparo de nível médio
e com o uso do computador.
Segundo Masini (1994, P. 144),
Para que o deficiente visual possa organizar o mundo ao seu redor
e nele se situar precisa dispor de condições para explorá-lo.
As situações educacionais necessitariam estar organizadas
de maneira que os deficientes visuais utilizassem suas possibilidades (táteis,
térmicas, olfativas, auditivas, cinestésicas) e deveriam
estar adequadas as suas experiências perceptivas.
4 METODOLOGIA
A pesquisa desenvolvida, entre março e julho de 2001, foi de caráter
descritivo, e caracterizada como pesquisa do tipo
levantamento. Como instrumento de coleta de dados foi utilizada a entrevista.
O universo da pesquisa foi constituído por instituições
que trabalham com a educação dos deficientes visuais, como:
a
Fundação Catarinense de Educação Especial
(FCEE) e a Associação Catarinense para Integração
aos Cegos (ACIC).
Também foram entrevistados 60 cegos dos 150 registrados atualmente
na ACIC, correspondendo a 40% do universo total.
Foram entrevistados, ainda, acadêmicos matriculados na Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC) e na Universidade do Vale do Itajaí
(UNIVALI).
5 RESULTADOS
Para levantar as formas de acesso à informação das
pessoas portadoras de deficiência visual e as dificuldades
encontradas no seu acesso, seguiu-se os caminhos traçados na metodologia
da pesquisa para alcançar os objetivos propostos.
Em Florianópolis, existe a Fundação Catarinense
de Educação Especial e a Associação Catarinense
para Integração
dos Cegos . As duas instituições fornecem um ciclo de aprendizagem
para o deficiente visual, cada qual usando métodos próprios
de ensino para possibilitar aos cegos o acesso à informação.
5.1 Fundação Catarinense de Educação Especial
A Fundação Catarinense de Educação Especial,
criada em 1968, é uma instituição mantida com verbas
estaduais, que tem
por finalidade atender e auxiliar todo e qualquer tipo de deficiência.
Tem por missão fomentar, produzir e difundir o
conhecimento científico e tecnológico referente à
educação especial. Possui salas de recursos especiais e profissionais
especializados. Este atendimento é restrito a alunos matriculados
nas escolas de ensino médio fundamental.
Nesta entidade, há um departamento especializado na transcrição
de livros didáticos e de literatura juvenil e infantojuvenil
para o Braille. A FCEE transcreve em média trezentos livros didáticos
por ano. Estes livros são escolhidos pelos
professores das escolas do ensino fundamental.
Os materiais didáticos são de fundamental importância
para educação dos deficientes visuais. São recursos
físicos
utilizados, com maior ou menor freqüência, em todas as disciplinas,
áreas de estudos ou atividades.
A FCEE possui os principais recursos para facilitar e auxiliar o deficiente
visual no processo de comunicação. Estes
recursos são constituídos por: reglete, punção,
máquina Braille, livro falado, mapas em alto relevo. Também
dispõe de
tecnologia mais avançada tais como: sistema de leitura ampliada,
thermoform, dosvox (sistema sonoro de comunicação
com o microcomputador), impressora braille.
A FCEE também possui um serviço de reabilitação
visual, para as pessoas que possuem a baixa visão.
5.2 Associação Catarinense para Integração
dos Cegos
A Associação Catarinense para Integração
dos Cegos, criada em 1977 tem por objetivo congregar os deficientes
visuais de todo o Estado, prestando assistência social, educativa,
jurídica e profissional. Procura integrar e reabilitar o cego como
cidadão na sociedade.
Na reabilitação, os profissionais especializados ensinam
os deficientes visuais desde a utilização correta no uso
da bengala,
até o exercício de tarefas domésticas, como por
exemplo: cozinhar e cuidar dos filhos. Também oferecem auxílio
no
sistema Braille, no sorobã (instrumento utilizado pelos cegos
para realizar operações matemáticas), na escrita cursiva
para
assinar o nome em tinta, na informática e cursos profissionalizantes
em parceria com o SINE (sistema nacional de emprego).
De acordo com a Associação, 70% dos deficientes visuais
não possui o 2° grau completo. Para a associação,
o desafio é
mudar o nível de escolaridade dos deficientes, pois, com isto,
haveria mais possibilidades de ingresso ao mercado de trabalho.
No entanto, há outras questões que causam esse impedimento:
os deficientes visuais não têm acesso às condições
apropriadas
para sua educação e aos recursos necessários para
viabilizar sua auto-educação.
5.3 Entrevista com os Deficientes Visuais
As entrevistas com os deficientes visuais foram realizadas com abordagens
aos 60 dos 150 deficientes visuais registrados
na ACIC. O objetivo principal das entrevistas era levantar informações
precisas sobre os obstáculos no acesso às
informações.
Verifica-se que, 75% dos entrevistados têm idade média entre
21 e 35 anos, e destes, 60% apresentam nível de
escolaridade que se situa predominantemente no primeiro grau.
Os entrevistados são provenientes de famílias de baixa
renda, e 75% dos deficientes visuais possui renda mínima. Tal
condição, não possibilita a aquisição
de livros em Braille ou de um computador com os programas de voz que levaria
ao uso
efetivo dessa tecnologia para obtenção de seus próprios
conhecimentos.
Entre os problemas apontados pelos entrevistados estão: a) professores
sem preparo adequado; b) falta de material e
bibliografias específicas em Braille nas bibliotecas; c) falta
de equipamento adequado nas universidades; d) falta de
colaboração e despreparo dos colegas.
A figura 1 apresenta as principais dificuldades que os deficientes visuais
encontram para o acesso à informação no
ambiente acadêmico, que são: 1) falta de material em Braille
nas bibliotecas; 2) condição social não permite ter
acesso à pouca
publicação que existe; 3) falta de computador com programa
de voz, por ser este um recurso caro no momento; 4) todas as
pessoas com baixa renda sofrem com a dificuldade de ter acesso à
informação.
Figura 1: dificuldades dos deficientes visuais no ambiente acadêmico
Os acadêmicos portadores de deficiência visual sentem-se
desprezados dentro das universidades. Eles acreditam que a
universidade deveria ter no acervo da biblioteca a literatura básica
de cada curso, dedicada ao deficiente visual. O que
deveria ser feito era disponibilizar em cada centro, computadores com
programas de voz. Este recurso ajudaria a
realizar trabalhos acadêmicos via internet.
Os principais problemas apontados dentro das universidades apresentados
na figura 2, foram os seguintes: 1) as
universidades não oferecem condições de estudos;
2) a maneira de avaliação não é uma maneira adequada,
um exemplo disso é a prova com consulta; 3) as universidades e os
professores não estão preparados para ter em sala de aula alunos
que não
enxergam.
Figura 2: problemas apontados pelos deficientes visuais no ambiente acadêmico.
Apesar das dificuldades apontadas, os deficientes visuais estão
sentindo pressão do mercado de trabalho. O mercado ficou
muito mais exigente. Passou a exigir escolaridade e certas competências
e habilidades nas diferentes áreas do conhecimento. E isto está
impulsionando os portadores de deficiência visual a buscarem qualificação
para conseguir um lugar no mercado de trabalho.
6 CONCLUSÃO
No Brasil, a educação especial, em suas linhas gerais,
tem os mesmos objetivos da educação geral. Visa formar o
deficiente de forma integrada, desde o jardim da infância até
a universidade, proporcionando condições que favoreçam
a
integração do deficiente visual na sociedade, onde irá
conviver e trabalhar.
Para que isso ocorra, alguns requisitos tornam-se necessários:
metodologia e/ou técnicas metodológicas específicas;
conteúdos curriculares adequados; professores habilitados; materiais
e equipamentos apropriados de ensino.
Mas, o que se observa é a existência de uma contradição
entre o discurso e a realidade. O deficiente visual, que depende
de recursos públicos para sua educação enfrenta
muitas barreiras e desafios.
Portanto, para a pessoa cega ocupar o espaço no mercado de trabalho,
tanto no setor social, quanto no profissional, o
acesso à informação, sem dúvida, é
essencial. A responsabilidade das instituições informacionais
é enorme nesta
questão e abrem-se mais perspectivas de trabalho entre biblioteca
e o público alvo. A responsabilidade dos profissionais
da informação é ainda maior. Cabe, na condição
de futuros profissionais da informação, ter consciência
que o mercado de
trabalho é amplo, mas que nessa área de informação
para o deficiente visual tem um papel fundamental que é proporcionar
a estes usuários a possibilidade de acesso à informação.
NOTAS
1 Trabalho apresentado no XX Painel de Biblioteconomia, em Florianópolis
nos dias 29 e 30 de outubro de 2001, realizado pela Associação
Catarinense de Bibliotecários – ACB.
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cultura e ao trabalho. Benjamin Constant, Rio de Janeiro, n.3, maio
1996. Disponível em: <http://www.ibcnet.org.br>.
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v. 6, n.15, p. 8-23, abr. 2000.
FERNANDES, Edicléa Mascarenhas. Educação para todos,
saúde para todos: a urgência da adoção de um
paradigma multidisciplinar nas políticas públicas de atenção
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Janeiro, v. 5, n. 14, p. 3-10, dez. 1999.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio
eletrônico: século XXI. Versão 3.0. São
Paulo: Nova Fronteira, 1999.
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MASINI, Elcie, F. Salzano. O perceber e o relacionar-se do deficiente
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NABAIS, Márcia Lopes de Morais, et al. Estudo profissiográfico:
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PEREIRA, Marília Mesquita Guedes. Biblioterapia: proposta
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1996.
________. Biblioterapia e a leitura crítica para a formação
da cidadania com os aluno do Instituto dos Cegos da Paraíba “Adalgisa
Cunha”. João Pessoa: UFPB. [19--].
RABELLO, Odilia Clark Peres. O deficiente visual e a Biblioteca Pública
Estadual Luiz de Bessa. Revista da Escola de Biblioteconomia da UFMG,
Belo Horizonte, v. 18, n. 1, p. 39-60, mar. 1989.
______________
THE VISUAL DEFICIENTS AND THE INFORMATION ACCESS
Abstract
This paper is a survey about the institutions and resources located
in Florianópolis that assist visual deficient through information
processes. It describes the institutions of Grande Florianópolis that
are technically ready to play such as role and discuss some difficulties faced
by deficient with regard to information access. Consider the information access
important to help integrate visual deficient into society.
Keywords: Information access; Visual deficients; Information retrieval;
Associação Catarinense para Integração aos
Cegos; Fundação Catarinense de Educação Especial.
_________________________________
Chirley Cristiane Mineiro da Silva
Bacharel em Biblioteconomia
Florianópolis – Santa Catarina
E-mail: krykr@bol.com.br
Jaqueline Turatto
Bacharel em Biblioteconomia
Florianópolis – Santa Catarina
E-mail: jackturatto@hotmail.com
Lizete Helena Machado
Bacharel em Biblioteconomia
Florianópolis – Santa Catarina
E-mail: lizetemachado@ig.com.br
Rev. ACB: Biblioteconomia em Santa Catarina, v. 7, n.
1, p. 09-19, 2002.