MARCOS HISTÓRICOS E LEGAIS DO DESENVOLVIMENTO DA PROFISSÃO DE BIBLIOTECÁRIO NO BRASIL

Ivone Job

Dalgiza Andrade Oliveira

Resumo: No panorama da biblioteconomia no Brasil, três segmentos devem ser mencionados: o ensino, a profissão e o mercado de trabalho. O ensino abrange as escolas de biblioteconomia de formação em níveis de graduação e pós-graduação (mestrado e doutorado). A profissão de bibliotecário implica na existência de leis regulamentadoras, nos ambientes de trabalho e nas atividades inerentes e específicas do profissional. O mercado é o reflexo das necessidades da sociedade que vai recepcionar o egresso das escolas e exigir transformações do profissional e das suas entidades representativas.

 
Palavras-chave:
Formação acadêmica; Biblioteconomia; Habilitação profissional; Entidades de classe; Legislação do Bibliotecário.

 

1 INTRODUÇÃO

 A formação acadêmica em Biblioteconomia no Brasil data do início do século vinte, mas o reconhecimento legal da profissão se deu em 1962 com a aprovação da Lei 4.084 dispondo sobre o exercício da profissão de bibliotecário e que ainda está em plena vigência. Em 1998, foi promulgada a Lei 9.674 trazendo complementações à Lei 4084. As Diretrizes Curriculares do Ministério da Educação atribuem às escolas a responsabilidade de definir o currículo, mas a profissão é instituída pelas entidades representativas da categoria. O mercado de trabalho do bibliotecário tem apresentado mudanças com as novas tecnologias e há cobranças da sociedade para que haja uma valorização de seu fazer e de seu saber profissional. Embora o bibliotecário esteja inserido na Consolidação das Leis do Trabalho - CLT como profissional liberal, ainda é nos serviços públicos onde vai encontrar mais oportunidades de atuação.  

De acordo com a Constituição Brasileira “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.” (BRASIL, 1988). Neste contexto, considera-se a importância da regulamentação profissional tanto para assegurar o exercício profissional de pessoas qualificadas e habilitadas para tal, quanto para assegurar e defender os interesses da comunidade e dos cidadãos, que procuram atendimento especializado.

A Biblioteconomia insere-se no campo da Ciência da Informação (CI), uma área científica que engloba alguns cursos ou disciplinas e profissionais e que, segundo Saracevic (1996, p. 41), pode ser “[...] definida como um campo englobando tanto a pesquisa científica quanto à prática profissional, pelos problemas que propõe e pelos métodos que escolheu, ao longo do tempo, para solucioná-los tendo em vista que esta se apresenta como campo teórico de investigação.”

A Ciência da Informação traz contribuições para o corpus teórico da Biblioteconomia pela sua natureza interdisciplinar, possibilitando interfaces com outras áreas de concentração de conhecimento, o que é salutar, pois estando em processo de construção se beneficia destes outros campos. Desta forma, hoje a atuação do bibliotecário se faz ao lado de outros profissionais, tais como o arquivista e o museólogo envolvidos na grande área da Ciência da Informação.

 

2 FORMAÇÃO ACADÊMICA EM BIBLIOTECONOMIA NO BRASIL

 

A formação acadêmica em biblioteconomia no Brasil data do início do século XX (CASTRO, 2000). De 1911 até os anos 40 foram criados quarenta e dois cursos, dos quais alguns desapareceram, outros surgiram nos anos posteriores, abrangendo 20 Estados e o Distrito Federal. Atualmente, tem-se 35 cursos de bacharelato em biblioteconomia nas instituições federais de ensino superior no Brasil, conforme mostra a Figura 1. Não constam deste quadro os cursos com outra denominação que não seja biblioteconomia.

O desenvolvimento dos cursos de biblioteconomia no Brasil inicialmente sofreu influências do modelo humanista francês, entretanto, em fins da década de trinta do século XX próximo passado já manifestava forte tendência à adoção do paradigma pragmático norte-americano, e que teve sua consolidação nos anos sessenta.

Em 1996, a publicação da Lei 9.394 que dispõe sobre as Diretrizes e Bases da Educação, desencadeou alterações em todas as esferas do ensino no país. Desde então, instrumentos legais emanados dos órgãos governamentais responsáveis pela educação no país desenvolvem ações no sentido de adequá-la à realidade vivida pelas escolas.

Após 2001, o Ministério da Educação deixou para cada escola a responsabilidade de definir o currículo específico além do que as mesmas terão o dever social e político de discutir com a categoria profissional. Conforme orientação do Parecer CNE/CES 67, de 11 de março de 2003, eliminou-se a exigência de currículos mínimos nacionais.

 

UNIVERSIDADE

CIDADE/ESTADO

 

DEPARTAMENTO /INSTITUTO A QUE PERTENCEM

 

UFAL

Maceió-AL

Não consta

UFAM

Manaus-Amazonas

Inst. Ciências Humanas e Letras. Dep. de Biblioteconomia

UFBA

Salvador-Bahia

Inst. Ciência da Informação

UFCE

Fortaleza-Ceará

Centro de Humanidades

UnB

Brasília-DF

Dep.Ciência da Informação e Documentação

UFES

Vitória-ES

Dep. Ciência da informação

UFG

Goiânia-GO

Faculdade de Comunicação e Biblioteconomia

UFMA

São Luís-MA

Centro de Ciências Sociais

UFMG

Belo Horizonte - MG

Escola de Ciência da Informação

FUOM

Formiga - MG

Escola de Biblioteconomia

UNICOR

Três Corações

Inst. Ciências Organizacionais e Administrativas

UNIPAC

Ubá - MG

Fac. Filosofia, Ciências e Letras de Ubá

IESF

Campo Grande - MS

Não consta

UNIRONDON

Cuiabá-MT

Não consta

UFMT

Cuiabá-MT

Não consta

UFPA

Belém-PA

Não consta

UFPb

João Pessoa - PB

Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Dep. de Biblioteconomia

UFPE

Recife-PE

Centro de Artes e Comunicação. Departamento de Ciência da Informação

UEL

Londrina-PR

Departamento de Ciência da Informação

UFF

Niterói-RJ

Instituto de Arte e Comunicação Social. Departamento de Documentação

UNIRIO

Rio de Janeiro-RJ

Centro de Ciências Humanas

USU

Rio de Janeiro-RJ

Inst. Tecnologia da Informação e da Comunicação

UFRN

Natal-RN

Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Dep.Biblioteconomia.

UFRGS

Porto Alegre-RS

Dep. Ciências da Informação

FURG

Rio Grande-RS

Dep. Biblioteconomia e História

UDESC

Florianópolis-SC

Não consta

UFSC

Florianópolis-SC

Centro de Ciências da Educação. Dep. de Ciência da Informação

PUCCAMP

Campinas-SP

Faculdade de Biblioteconomia

FATEA/Lorena

Lorena-SP

Não consta

UNESP

Marília-SP

Faculdade de Filosofia e Ciências Dep.Ciência da Informação

USP

Ribeirão Preto-SP

Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras

FAINC

Santo André-SP

Faculdade de Biblioteconomia

UFSCar

São Carlos-SP

Dep. Ciência da Informação

FESP

São Paulo-SP

Faculdade de Biblioteconomia e Ciência da Informação

USP

São Paulo-SP

Escola de Comunicação e Artes. Dep. de Biblioteconomia e Documentação

FIGURA 1: Quadro com as instituições que possuem o curso de biblioteconomia no Brasil.

Fonte: ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO. Niterói: Universidade Federal Fluminense. Disponível em: <http://www.abecin.org.br/portal/abecin/main.php?sl=ens> Acesso em: 10 ago. 2006.

 

O Parecer n. 108 do CNE que trata, especificamente, da duração dos cursos de bacharelado, revela o interesse do governo quando o mesmo estipula a duração dos currículos de cursos em nível de bacharelato presenciais. São, na verdade, recomendações da União Européia e para atender ao acordo Mercosul (BRASIL, 2003). Percebe-se uma tendência globalizante de atender mercados econômicos, uniformizando e harmonizando os sistemas educacionais dos países membros dos acordos para que os profissionais possam ir e vir.

Vale analisar, situar a área e o campo de atuação do profissional para contextualizar a Biblioteconomia no Brasil neste leque de profissões cada vez mais ampliado. Será utilizado para tal análise o campo científico da Biblioteconomia, os instrumentos de mercado de trabalho, as leis referentes ao bibliotecário e a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO). “A CBO é um documento que reconhece, nomeia, codifica os títulos e descreve as características das ocupações do mercado de trabalho brasileiro.” (BRASIL, 2006).

 

2.1 A profissão de bibliotecário

 

A profissão de bibliotecário é instituída pelas suas entidades representativas. A Biblioteconomia no país hoje apresenta a seguinte estrutura:

 

O Conselho Federal de Biblioteconomia - CFB que congrega os Conselhos Regionais de Biblioteconomia - CRB, que tem como objetivo maior a fiscalização do exercício e da ética profissional;

-A Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários - FEBAB que congrega as Associações Estaduais, que perseguem objetivo de promover a atualização profissional através de eventos, publicações e cursos, assim como buscam o fortalecimento da imagem do profissional no país entre outras ações [...?]

- Os sindicatos que defendem o profissional através da legislação dos fóruns trabalhistas e negociam junto às empresas e governo o piso salarial dos profissionais, bem como outros benefícios que a lei propicia aos trabalhadores de um modo geral;

- A Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Ciência da Informação - ANCIB que congrega os pesquisadores da área de Ciência da Informação, dentre os quais o bibliotecário. Tem como importante objetivo promover o debate informacional e desenvolvimento de pesquisa na área, resultando em aumento da produção científica nacional;

Finalizando, a Associação Brasileira de Ensino de Biblioteconomia, Documentação e Ciência da Informação – ABEBD1  que congrega as escolas de biblioteconomia, documentação e ciência da informação do país, com o objetivo de debater todas as questões inerentes à formação do profissional, do mercado de trabalho e do próprio profissional da informação. (VALENTIM, 2000, p. 9-10).

 

Ao graduar-se, o bibliotecário torna-se bacharel, e, ao obter o registro profissional, o mesmo encontra-se habilitado a desempenhar suas funções profissionais.

Resgata-se na história da criação das entidades brasileiras de biblioteconomia o início do reconhecimento à profissionalização do bibliotecário:

 

Na década de 50, algumas bibliotecárias brasileiras, lideradas pela dinâmica figura de Laura Garcia Moreno Russo, de São Paulo, iniciaram os esforços para ver a biblioteconomia oficialmente reconhecida junto aos poderes públicos e junto à sociedade brasileira. A primeira vitória veio em 1958, com a Portaria nº 162 do MTPS – Ministério do Trabalho e Previdência Social, através da qual a profissão de bibliotecário foi regulamentada no Serviço Público Federal, tendo sido incluída no 19º Grupo das profissões liberais. Em 1962 veio a coroação de todos esses esforços, com a aprovação da Lei nº 4084, que regula, até hoje, o exercício da profissão de bibliotecário no Brasil e estabelece as prerrogativas dos portadores de diploma em biblioteconomia no país2 .

 

Vale salientar o esforço deste grupo de bibliotecários e a visão de Laura Russo. Se hoje se questiona a regulamentação profissional, naqueles tempos foi uma vitória pois refletia um desejo da categoria. E, mesmo no século XXI, várias profissões no Brasil tentam sua regulamentação, fundadas nos desejos profissionais de reconhecimento e no receio de se virem tomadas por leigos ou estranhos à profissão.

Em seu artigo 6, a Lei 4.084/62 traz as seguintes atribuições dos Bacharéis em Biblioteconomia:

São atribuições dos Bacharéis em Biblioteconomia: a organização, direção e execução dos serviços técnicos de repartições públicas federais, estaduais, municipais e autarquias e empresas particulares concernentes às matérias e atividades seguintes: o ensino de Biblioteconomia; a fiscalização de estabelecimentos de ensino de Biblioteconomia reconhecidos, equiparados ou em vias de equiparação; administração e direção de bibliotecas; a organização e direção dos serviços de documentação; a execução dos serviços de classificação e catalogação de manuscritos de livros raros e preciosos, de mapotecas, de publicações oficiais e seriadas, de bibliografia e referência. (grifo nosso)

 

Este artigo descreve as atribuições do Bibliotecário com status de profissional liberal de nível superior. Observa-se a visão  Laura Russo ao colocar na Lei “a organização e direção dos serviços de documentação.” Não citou documentos impressos tão somente, mas, pode-se inferir daí outros suportes dos documentos, tais como os eletrônicos que hoje tem-se em profusão na sociedade de informação. Salienta-se também “a organização, direção e execução dos serviços técnicos de repartições públicas federais, estaduais, municipais e autarquias e empresas particulares”, isto é, a administração e gerência dos serviços, o que hoje é visto como gestão, uma área da administração que compete ao bibliotecário quando em ambientes como bibliotecas e centros de documentação.

Em 1965, através do Decreto n. 56.725, foi regulamentada a Lei n. 4.084/62 e, em seus Artigos 8 e 9, repetem-se, quase de forma idêntica, as atribuições  expostas na lei de 1962.

De 1962 a 1998, trinta anos se passaram, um intervalo em que se observaram alterações no fazer bibliotecário. Por volta de 1990 o CFB elaborou um projeto de lei que alteraria a lei 4084. Para tanto, colaboraram com sugestões as escolas de biblioteconomia, as entidades associativas e os profissionais. Neste documento a expressão “informação registrada” foi a tônica, porque pensava-se que o bibliotecário seria o profissional que trataria a informação registrada em qualquer suporte. A intenção era garantir que as atividades de tratamento, registro e recuperação da informação registrada fossem exclusivas do bibliotecário. Justamente esta expressão foi o motivo dos vetos apresentados, por pretender ter uma reserva de mercado que era também de outras profissões que trabalham com a informação, tais como jornalista, relações-públicas, informática e outras. A Lei 9.674 foi promulgada, trouxe complementações à Lei 4084 sem, no entanto, revogá-la. Apresentou como novidade, a figura do técnico em biblioteconomia de forma restritiva e as penalidades aos leigos que exercerem a atividade inerente ao bibliotecário: O termo técnico em biblioteconomia aparece num dispositivo legal, pela primeira vez. No parágrafo terceiro do artigo trinta e três há a menção ao técnico em biblioteconomia, numa situação específica: este será aceito somente no âmbito legal em municípios com até 10 mil habitantes em bibliotecas públicas com até 200 livros catalogados. (Lei 9674, 1998, art.33, §3).

Além desta novidade, a lei trouxe ainda no artigo quarenta e cinco, a normatização das denúncias e, no artigo subseqüente, o enquadramento de pessoas não habilitadas na Lei de Contravenções Penais, bem como pagamento de multa. No artigo 47, acresce ao já definido nas leis anteriores, que torna equivalentes, para todos os efeitos, os diplomas de bibliotecário, de bacharel em biblioteconomia e de bacharel em biblioteconomia e documentação. Portanto, todos os cursos criados, similares à biblioteconomia, que não expedem um diploma com as denominações acima, devem estar cientes de que seus egressos não poderão se registrar nos Conselhos Regionais e esta decisão deverá ser dada a conhecer ao corpo discente, para que possam fazer sua opção sem a ilusão de poderem efetuar o registro.

A fiscalização do exercício profissional está sob a égide dos Conselhos que são instituições autárquicas dotados de personalidade jurídica própria agindo por delegação do Poder Público. No caso da profissão de bibliotecário, cabe aos Conselhos Regionais de Biblioteconomia, atualmente com 14 jurisdições, realizar o procedimento.

Conforme Lima (2004) e Freitas (2002) a natureza jurídica leva ao entendimento de que a regulamentação profissional é uma questão de cidadania. Primeiro, porque, em essência, as ações desses órgãos visam garantir a prestação de serviços de informação aos cidadãos brasileiros com uma qualidade presumida e, por isso, lutam para que esses serviços sejam prestados por profissionais habilitados, única maneira de assegurar que as funções social e ética das profissões que representam sejam cumpridas de modo eficaz.

Recorrentemente, inclusive por falta de conhecimento sobre as atribuições do profissional bibliotecário, as instituições tendem a contratar leigos para exercerem atividades atinentes ao perfil deste profissional. Exemplo disso são alguns programas governamentais que, na tentativa até louvável de trabalhar a importância do hábito à leitura, desconsideram a figura do bibliotecário que deveria estar inserido neste tipo de iniciativa. Inúmeras vezes estes programas são confiados a leigos despreparados, inabilitados e em alguns casos sequer com formação no ensino médio. A sociedade não pode ser penalizada por negligência dos órgãos responsáveis em aferir este tipo de situação.

Neste sentido, os Conselhos exercem um papel intransigente na defesa dos interesses da comunidade, pois não visam apenas assegurar a presença e o envolvimento de bibliotecários nestes programas, mas, também, a garantia da qualidade destas iniciativas bem como a observância no uso de recursos públicos. Diante disso, a qualidade destes programas fica comprometida podendo não atingir os resultados que espera obter para o fortalecimento do combate à erradicação do analfabetismo no Brasil e para a ampliação do acesso aos bens culturais. 

 

2.2 Bibliotecário: profissão social

 
No processo de desenvolvimento da profissão de bibliotecário no Brasil, é importante destacar que cada mudança sofrida ocorre num determinado contexto sócio-político e cultural próprio.

No caso do mercado de trabalho do bibliotecário, por exemplo, é inexorável que tenham surgido mudanças no seu fazer profissional ocasionadas pelo impactos das novas tecnologias.  A adoção destas novas ferramentas tem colocado sistematicamente desafios na formação acadêmica oferecida atualmente nos cursos de Biblioteconomia, bem como na constante necessidade e premência da busca da educação continuada com a finalidade de atualização permanente. 

A necessidade de o  bibliotecário  se adequar às novas exigências tem sido muito acentuada, principalmente pelas cobranças que sofre da sociedade e, também, em decorrência de suas dificuldades em colocar-se de maneira mais efetiva no mercado, valorizando o seu fazer e o seu saber profissional. As possibilidades que as alterações no mercado de trabalho oferecem é uma recorrência natural em muitas profissões, inclusive na biblioteconomia.

No mercado de trabalho um importante guia foi publicado com a atualização em 2002. Fala-se da última versão da Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), em que se encontram categorizados, na família dos Profissionais da Informação,o bibliotecário, o documentalista, e o analista de informações. Como família afim existem o técnico em biblioteconomia e o auxiliar de biblioteca.  Têm-se, então, formalmente, três patamares profissionais descritos pelo Ministério do Trabalho e Emprego brasileiro. Faz-se necessário esclarecer aqui, devidamente, o que é a CBO, tentando evitar erros freqüentes de avaliação.

A CBO não é lei, é uma portaria do Ministério do Trabalho. Não regulamenta profissões e nem cria cargos, não representa aspirações de uma categoria de trabalhadores, é descrição de atividades de diferentes profissões, uma nomenclatura. Não é garantia de que as profissões ali descritas sejam regulamentadas e nem é esta sua preocupação. As atividades refletem a realidade do grupo que representa em termos de atividades desempenhadas nos diversos ambientes em que se faz presente o trabalhador. Ela é uma fonte de informações importante para as estatísticas nacionais dos registros administrativos do governo, para os serviços de intermediação de mão de obra e para a elaboração de currículos e programas de qualificação do trabalhador. É um documento normalizador do reconhecimento da nomeação e da colocação dos títulos e conteúdos das ocupações do mercado de trabalho brasileiro. É um reconhecimento para fins classificatórios sem função de regulamentação profissional. Aliás, este esclarecimento, está claro na CBO, ao colocar as denominações equivalentes a bibliotecário. “[...] o exercício dessas ocupações requer bacharelado em biblioteconomia e documentação. A formação é complementada com aprendizado tácito em local de trabalho e cursos de extensão”3.

É preciso desmistificar a CBO, atribuindo a ela o que nem ela se atribui e utilizá-la da forma em que é recomendada.

 

3 CONCLUSÕES

 
            Diante do quadro apresentado com referência à história da formação acadêmica e profissional do bibliotecário, do ensino, a sua regulamentação no Brasil, suas atividades e sua atuação com todos os desafios e as mudanças, cuida-se de esclarecer o que ocorre. Podem ser cometidos equívocos de interpretação se for feita uma análise sem a profundidade necessária para os fatos marcantes que construíram uma profissão e para as  pessoas que no passado batalharam pelo seu reconhecimento e regulamentação.

 

Desta forma é necessário aprofundar mais estudos a respeito do conjunto de atribuições, das funções e tarefas da prática profissional no ambiente de atuação do bibliotecário, com seriedade, com conhecimento do “pano de fundo” político, econômico, histórico e legal, que circundam o problema, para analisá-lo de forma imparcial com objetividade e clareza.

 

As entidades representativas da categoria nas áreas de fiscalização e regulamentação profissional, as escolas de biblioteconomia, as associações e sindicatos, não existem em vão. Foram criados a partir de uma demanda dos próprios bibliotecários, que delas fazem parte estudando, decidindo, interagindo. São mais de quarenta anos de profissão regulamentada no Brasil, mais de cinqüenta anos de movimento associativo e mais de noventa anos de ensino. A Biblioteconomia no Brasil tem uma história para ser contada, refletida e respeitada.

 

NOTAS

1 Atualmente denominada Associação Brasileira de Educação em Ciência da Informação – ABECIN.

2 Histórico CFB. http://www.cfb.org.br/html/historico_03.asp

3 Disponível em: <http://www.mtecbo.gov.br/regulamentacao.asp#b>. Acesso em: 20 maio 2006.

 

REFERÊNCIAS

ABECIN. ASSOCIAÇÃO DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO. Ensino. Disponível em: <http://www.abecin.org.br/portal/abecin/main.php?pageNum_escolas=ens>. Acesso em: 5 jul. 2006.

BRASIL.  Lei n.. 9.674, de 25 de junho de 1998.  Dispõe sobre o exercício da profissão de Bibliotecário e determina outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, n.120, Seção I, p.1-2, 23  jun. 1998.

BRASIL.  Ministério do Trabalho e Emprego.  Classificação Brasileira de Ocupações.  Disponível em: <http://www.mtecbo.gov.br/>.  Acesso em: 23 maio 2006.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 37. ed. atual. ampl. São Paulo: Saraiva, 2005. (Coleção Saraiva de Legislação).

BRASIL. Decreto n... 56.725, de 16 de agosto de 1965. Regulamenta a Lei no.. 4084, de 30 de junho de 1962, que dispõe sobre o exercício da profissão de Bibliotecário. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 19 ago.1965.

BRASIL. Lei n.. 4.084, de 30 de junho de 1962.  Dispõe sobre a Profissão de Bibliotecário e regula seu exercício. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 02 de julho de 1962.

BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, n.248, Seção I, p.27.833, 23  dez. 1996.

BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. CONSELHO NACIONAL DE DUCAÇÃO. CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO SUPERIOR. CÂMARA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR. Carga horária  mínima dos cursos de graduação-Bacharelados, na modalidade presencial. Parecer CNE/CES n. 108, 7 de maio de 2003. Relator: Edson de Oliveira Nunes.

CASTRO, César Augusto. História da Biblioteconomia Brasileira: perspectiva histórica.  Brasília: Thesaurus, 2000.

O CFB: histórico. Disponível em: http://www.cfb.org.br/html/historico_03.asp.> Acesso em 24 out. 2005.

FREITAS, Lúcia Maria de Paula. Procedimentos fiscalizatórios. In: FÓRUM DO CONSELHO FEDERAL DE BIBLIOTECONOMIA, 1. Fortaleza, 2002. Disponível em: < http://www.cfb.org.br/html/saladeleitura_procedimentos.asp>. Acesso em: 15 mar. 2006.

LIMA, Raimundo. Conselhos Federal e Regionais de Biblioteconomia: papéis e responsabilidades. Brasília, 2004. Disponível em: < http://www.cfb.org.br/html/saladeleitura.asp. > Acesso em: 15 mar. 2005.

SANTOS, Jussara Pereira Santos; NEVES, Iara Conceição Bittecourt: JOB, Ivone. A estrutura da carreira em biblioteconomia: contribuição à Classificação Brasileira de Ocupações. Em Questão, Porto Alegre, v.10, n.1, p. 41-61, 2004.

SANTOS, Jussara Pereira. O perfil do profissional bibliotecário. In: VALENTIM, Marta Lígia Pomim (Org.). Profissionais da Informação: formação, perfil e atuação profissional. São Paulo: Polis, 2000. Cap. 5, p.107-118.

SARACEVIC, Tefko. Ciência da informação: origem, evolução e relações. Perspectivas em Ciência da Informação, Belo Horizonte, v.1, n.1, p. 41-62, jan./jun. 1996.

VALENTIM,Marta Lígia Pomim (Org.). Profissionais da Informação: formação, perfil e atuação profissional.São Paulo:Polis, 2000.

VALENTIM,Marta Lígia Pomim. Formação: competências e habilidades do profissional da informação. In: VALENTIM, Marta Lígia Pomim (Org.). Formação do profissional da informação. São Paulo: Polis, 2002.

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HISTORICAL AND LEGAL ASPECTS OF BRAZILIAN LIBRARIAN PROFESSION

Abstract: Panorama of Brazilian Library Science (Librarianship) three segments must be mentioned: education, the profession and the work place. Education encloses the schools of Library Science in levels of higher education (college degree) and masters and doctoral studies. The librarian profession implies in the existence of laws, at the work place and specific activities of these professional. The market represents some consequences about what kind of librarian abilities and competencies must show. Conclude that some changes must occur because a new demand about the librarian competencies and abilities and quests from the society to the representative entities.

Keywords: Academic formation; Librarianship; Library Science; Professional qualification; Professional - Entities; Librarian - Legislation.

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Ivone Job

Bibliotecária formada em 1980 pela UFRGS. Especialista em bibliotecas de instituições de nível superior, 1989 pela UFRGS/CAPES. Mestre em Ciência da Informação pela Escola de Ciência da Informação da UFMG, 2006.Atividades de classe: Presidente do CRB-10 (RS) 1996-2000. Conselheira Federal de Biblioteconomia em duas gestões: 1a. secretária de 2000-2003; Vice-presidente de 2003 a 2006.

Bibliotecária da UFRGS: 1981 a 1996 na Faculdade de Farmácia; de 1996 até agora da Escola de Educação Física.

E-mail: ivonejob@yahoo.com.br

 

Dalgiza Andrade Oliveira

Formada em Biblioteconomia pela UFMG. Mestre em Ciência da Informação pela UFMG, 2006. Bibliotecária consultora em documentação. Atividades associativas: Presidente do CRB-6 (MG) em duas gestões: 1996-2001. Conselheira Federal de 2003 a 2006 como 1a. secretária.  

E-mail: dalandrade@yahoo.com.br

 
 

Artigo recebido em: 29/08/2006

Aceito para publicação em: 09/11/2006

Revista ACB: Biblioteconomia em Santa Catarina, Florianópolis, v.11, n.2, p. 259-272, ago./dez., 2006.